sábado, 23 de janeiro de 2016

Tudo Bem?


- Oi.
- Oi.
- Tudo bem?
- Tudo bem.
- Que bom.
- Sim, que bom. Mas... você perguntou querendo realmente saber se tá tudo bem?
- Sim, claro! Se eu perguntei é porque eu realmente quero saber.
- Ah! Então você deve saber que nunca tá tuuudo bem.
- Sim, eu sei que nunca tá "tuuudo" bem.
- Pois é, então se você sabe que nunca está tudo bem e quer saber realmente se tá tudo bem, por que você não se preocupou em saber o que não tá bem?
- Desculpe, mas entendi.
- Presta atenção: você perguntou se tá tudo bem, certo?
- Sim, sim, perguntei.
- Você realmente quer saber se tá tudo bem, certo?
- Sim, eu realmente quero saber.
- Eu respondi que tá tudo bem.
- Foi, você disse que tá tudo bem.
- Mas você sabe que nunca tá tuuudo bem.
- Sim, você tem toda razão, todos sabemos que nunca tá tudo bem.
- Pois então, você disse que quer saber realmente se tá tudo bem. Eu disse que tá tudo bem. Mas você sabe que não tá. Então, por que não perguntou o que não tá bem se quer realmente saber se tá tudo bem?
- É, você tá certo.
- Pois é.
- Tá okay... vamos começar de novo. Oi.
- Oi.
- Tudo bem?
- Tudo.
- Que bom.
- Sim, que bom. Mas você quer realmente saber se tá tudo bem?
- Não.



(Matheus Queirozo)

sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

Um Doutor Sofista

Por Marco Bezerra*



Inicialmente a ideia central era uma leitura descontraída. O livro é escrito por dois autores, Clóvis de Barros Filho (Bacharel em Filosofia e Direito pela USP) e Júlio Pompeu (Doutor em Psicologia, professor de Ética do Departamento de Direito na PUC- Rio). Títulos como o doutorado não garantem explicações coerentes sobre questionamentos filosóficos. Não que seja uma regra, mas pessoas não formadas em filosofia têm grandes possibilidades de falarem besteiras, a colocação errada das palavras em um discurso, por exemplo. Uma exceção a essa regra foi o grandíssimo Benedito Nunes – professor de filosofia na Universidade Federal do Pará –, formado em direito, mas com uma intelectualidade apurada em filosofia. Com base nisso será feito ressalvas pontuais sobre o despreparo do doutor em Psicologia, Júlio Pompeu. Deixo registrado minha admiração pela habilidade em sintetizar assuntos complexos e pela vocação em ministrar aulas de Clóvis de Barros Filho.
No terceiro capítulo de Júlio Pompeu, o sétimo do livro, o seguinte trecho: “Tudo o que é justo é também belo e bom. Esta sentença é lugar comum entre os antigos gregos. Platão, por exemplo, a cita como argumento na última parte do Banquete, quando Sócrates, para contrapor-se aos discursos até então proferidos sobre Eros – o amor -, afirma que a deusa não é bela e, por isso, também não pode ser boa e nem justa. (...). À primeira vista, esta associação de justiça com beleza e bondade para nós, que não somos gregos antigos não tem nada de óbvia. É, ao contrário, muito estranha. Imagine o quanto é absurdo considerar que alguém seja bom e justo só por ser bonitinho. Ou o contrário, que alguém seja indigno de confiança ou necessariamente mau só porque é feioso. ” (P. 195 e 196). O que o doutor Júlio Pompeu desconhece é que no período antigo os gregos associavam beleza também aos gestos, as atitudes, por exemplo, não sujar o espaço público é considerado uma bela atitude. Fiquei curioso para saber qual tradução da obra de Platão Júlio Pompeu se baseou. Ainda no sétimo capítulo do livro me chamou atenção outra deselegância do doutor, o menosprezo. Pessoas como Júlio Pompeu acham que desprezar é sinônimo de “ser crítico”. O respeito a uma obra importantíssima para a construção do pensamento ocidental, como A República de Platão deveria ser enfatizada apesar de alguma eventual discordância. Se a intenção é passar uma imagem de crítico, antes de mais nada, admirável seria a fundamentação de tal posicionamento. Anteriormente, o doutor estava falando sobre a Alegoria da Caverna – uma metáfora para explicar que a verdade reside no conhecimento filosófico. Talvez ele não saiba o que quer dizer essa figura de linguagem. Segue o fragmento “(...). De repente, um destes homens – sabe-se lá o porquê – se vê livre das correntes. Ele volta para a entrada da caverna, mas não vê nada, pois seus olhos, que nunca viram luz tão intensa, doem. ” (P. 202). O fato de ter se libertado das correntes foi a forma, metaforicamente, de dizer que o homem livre ao buscar o conhecimento verdadeiro é impulsionado pela curiosidade do saber. O homem, então solto, se depara com a luz do sol, a luz da verdade que no primeiro momento dói, por ir contra ao que se acreditava antes.

No último capítulo na página 222, o doutor Júlio Pompeu usa o termo idiota e não sabe seu significado. “(...). Todas as regras de comportamento que, muitas vezes, requerem disciplina ou repressão dos desejos para seu cumprimento. Assim que aquele que em dia de frio vence a cama quente e aconchegante, levanta-se e congela no chuveiro, come coisas amargas e tristes e sorri feito um idiota depois de bater o carro, tem qualidade de vida. ” O idiota é o apolítico, isto é, aquele que não sabe viver em comunidade, em outras palavras, o indivíduo, e não tem relação com supressão de desejos. 
Com todo respeito, coitados dos alunos da disciplina Ética no departamento de Direito da PUC do Rio de Janeiro que serão formados. Erros repassados – a primeira e única obra que leio de Júlio Pompeu -  e como consequência, uma quantidade absurda de advogados expondo pensamentos incoerentes e empregando palavras erradas por aí a fora. 

*Marco Bezerra é um tranquilo estudante de Filosofia da Universidade Federal do Pará e um inconformado diante de equívocos filosóficos. Nascido em 1989, na cidade de Belém do Pará, Marco está sempre observando o que é dito sobre filosofia e esse texto "Um Doutor Sofista" é sua estreia aqui no Blog Eu Vomitando.